Antes de pôr as turmas do 3º ao 5º ano para recorrer à internet, mostre como montar um projeto, identificar fontes confiáveis e articular dados
Ana Rita Martins (ana.martins@abril.com.br)colaborou Bianca Bibiano
O professor diz: "Na próxima aula, tragam um trabalho sobre o tema X". É a deixa para o improviso: sem saber como pesquisar, os alunos
copiam o conteúdo do primeiro site indicado pelo buscador ou trechos de qualquer livro a que tenham acesso. O resultado é a frustração - tanto do professor, que em vez de trabalhos autorais recebe cópias, como dos estudantes, que não entendem o porquê de terem tirado uma nota baixa.
O fato é que a pesquisa, procedimento essencial a todas as áreas do conhecimento, não é algo inato ou intuitivo. É dever do docente ensinar a fazê-la e acompanhar cada parte do processo. O primeiro passo, segundo Marcos Bagno, autor do livro Pesquisa na Escola - O Que É, Como Se Faz, é determinar os rumos do trabalho. Nesse estágio, o ponto c
entral é garantir que a atividade faça sentido para a garotada. Por isso, vale a pena dedicar algum tempo à definição do objetivo e da justificativa - que indicam por qual razão o assunto está sendo esquadrinhado.
Igualmente importante é definir um produto final: pode ser um seminário, um vídeo, uma publicação coletiva, um texto escrito para ser lido na classe... Seja qual for a escolha, o fundamental é ampliar o público. Por dois motivos: primeiro, como forma de incentivar a preocupação com os propósitos da pesquisa e a forma como ela será comunicada. Segundo, para que a pesquisa cumpra verdadeiramente sua função. Se na sociedade a meta de uma investigação é disseminar informações, não faz sentido que na escola ela se transforme em um contato restrito entre aluno e professor. Depois dessa discussão coletiva, os pontos principais do projeto devem ser registrados e compartilhados com a turma de modo a servir como um guia para a atividade.
Quando chega o momento de buscar dados, as atenções devem se voltar para a definição das fontes de consulta. Vale ressaltar para a turma que, quando se trata de pesquisar em produções escritas, como livros e revistas, que a data da publicação é muito importante para a informação ser a mais atualizada possível. Buscar fontes variadas e cruzar informações também é requisito para uma investigação confiável.
No caso da pesquisa em internet, o professor precisa primeiramente desconstruir certos vícios da garotada. Flora Perelman, membro da Rede Latino-Americana de Alfabetização e doutora em Psicologia, fez uma pesquisa com 22 alunos do 5º e 6º anos da escola primária argentina para entender como eles buscavam informações na rede. Chegou à conclusão de que os estudantes não se debruçam cuidadosamente sobre a escolha das palavraschave e entram no primeiro site da lista, sem fazer nenhuma análise prévia sobre sua confiabilidade.
Na internet, com confiança
Esse comportamento é ainda mais complicado do que recorrer, digamos, a um livro ultrapassado. Roger Chartier, professor e diretor do Centro de Pesquisas Históricas em Ciências Sociais na École des Hautes Etudes, na França, diz que há um sistema de referências nas fontes impressas que minimizam a possibilidade de erro na publicação de informações. Na internet, esse filtro, quando existe, é bem menos seletivo. Por isso, mais do que nunca, é necessário ensinar a turma a refletir e a qualificar suas fontes na grande rede. Para Flora, uma maneira interessante de levar os alunos a analisar os sites (leia a seqüência didática na página seguinte) é pedir que eles justifiquem a escolha de um endereço perguntando quais critérios sustentam a opção. Perguntas como "A instituição, grupo ou pessoa que disponibilizou as informações tem conhecimento sobre o tema?" e "Qual interesse teria em divulgar esses dados?" desenvolvem a reflexão crítica na pesquisa.
O norte de uma pesquisa
Também é preciso cuidar para que o trabalho não perca o foco, o que acontece quando a coleta de dados é muito ampla ou foge da proposta. Para prevenir a ocorrência desse problema, uma boa opção é desenvolver, junto com a classe, uma lista de perguntas-chave que devem ser respondidas até o fim da atividade. Ter o questionário como referência ajuda no passo seguinte: o fichamento.
Essa etapa nada mais é do que registrar por escrito as informações mais relevantes. Com o fichamento em mãos, é hora de começar a síntese do trabalho, que deve conter o que entrará de fato na pesquisa. Se o trabalho foi bem feito até aqui, o risco de que o produto final seja uma cópia de alguma fonte é muito baixo - a articulação de diferentes fontes de informação exige do aluno uma postura ativa e autoral. "Se o professor acompanhou de perto todas as etapas do processo, ele vai saber o que é criação do estudante e o que é simples reprodução. Isso é fundamental para orientar a confecção de textos que reúnam, de maneira coesa e coerente, os dados selecionados na pesquisa", afirma Flávia Lobão, professora da escola Sá Pereira, no Rio de Janeiro. A produção de sua turma de 5º ano ilustra o passo-apasso apresentado nesta reportagem.
Assim, a garotada aprende desde cedo que uma pesquisa de verdade não se constrói sem o diálogo com produções anteriores - mas que, para fazer a diferença, também deve agregar algum novo conhecimento ou reflexão ao tema.
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Para cada pesquisa, um projeto
Título - Monteiro Lobato, vida e obra
TÍTULO
O nome da pesquisa pode ser mudado no decorrer do processo. Mas serve, de início, como uma síntese de idéias para guiar o trabalho dos alunos.
Objetivo - Conhecer a importância de Monteiro Lobato na literatura e na história do Brasil.
OBJETIVO
É a contribuição que o grupo quer dar ao conhecimento daquele tema. Tem a função de balizar a turma na hora de selecionar os dados que devem ser pesquisados.
Justificativa - Monteiro Lobato é considerado o mais importante autor de literatura infantil no Brasil. Além disso, foi o fundador de algumas das primeiras editoras do país, que existem até hoje.
JUSTIFICATIVA
É a defesa que se faz do projeto. Nela, deve constar a importância do tema escolhido e a relevância do trabalho para as pessoas envolvidas e para a sociedade.
Metodologia - Leitura de obras de referência e fichamento de dados.
METODOLOGIA
É o modo de obtenção dos dados que sustentam a pesquisa. Indica os suportes principais em que devem ser buscadas as informações.
Produto Final - Um texto informativo sobre Monteiro Lobato.
PRODUTO FINAL
É como a pesquisa será apresentada. Qualquer que seja a escolha, é importante que o produto venha acompanhado de algum tipo de registro escrito.
Quadro adaptado do livro Pesquisa na escola - O que é, como se faz, de Marcos Bagno
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Passo-a-passo do trabalho
1 DEFINIÇÃO DE TEMA E OBJETIVO Parte fundamental para o início de uma pesquisa, deve ser feita com base na definição do propósito do trabaho e de seus destinatários.
2 PESQUISA DE DADOS Deve ser pautada pelos critérios de confiabilidade e atualidade. A troca de informação entre os alunos ajuda a confrontar dados.
3 AMPLIAÇÃO DA PESQUISA Etapa opcional, inclui entrevistas que podem servir para matizar ou contextualizar os dados investigados.
4 FICHAMENTO DAS INFORMAÇÕES A seleção dos trechos mais significativos de cada fonte pode ser feita com caneta marca-texto ou transcrição. O essencial é que a turma identifique os dados que respondam aos propósitos da pesquisa.
5 APRESENTAÇÃO DO TRABALHO A etapa final não deve ser a única avaliada, mas é importante notar se o aluno relacionou de forma coerente e coesa os diferentes dados que coletou.
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BIBLIOGRAFIA
Educar pela Pesquisa, Pedro Demo, 156 págs., Ed. Autores Associados, tel. (19) 3249-2800, 27 reais
Pesquisa na Escola - O Que É, Como Se Faz, Marcos Bagno, 102 págs., Ed. Loyola, tel. (11) 2914-1922, 9,80 reais
fonte: http://revistaescola.abril.com.br
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