sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Será que ficou fora de moda cantar o hino nacional?

Será que ficou fora de moda cantar o hino nacional? Ou será que ele tem uma letra difícil de ser compreendida e memorizada? O desinteresse por um dos mais importantes símbolos nacionais pode ser observado na manifestação mais popular do país: o futebol. Na hora da execução do hino, a sensação é que muitos jogadores apenas movem os lábios e outros nem ousam fingir que sabem a letra. Enquanto isso, boa parte da torcida sequer presta atenção, canta outra coisa ou simplesmente conversa. Mas isso nem sempre foi assim.

hino nacional
© istockphoto.com / Duncan Walker

O hino nacional foi um dos símbolos usados na formação da identidade brasileira. Sua parte musical já existia e era tocada, por exemplo, durante a Guerra do Paraguai (1864-1870) para motivar os cerca de 80 mil combatentes brasileiros que participaram da campanha. A música composta entre 1822 e 1823 por Francisco Manuel da Silva chamava-se “Marcha Triunfal” e celebrava a Independência do país. Antes de chegar à versão atual, ele teve duas letras diferentes durante o Império. De lá até o período da ditadura militar (1964-1985), o hino foi, ou por conta de um genuíno sentimento nacionalista ou em função da imposição oficial, tratado como algo “sagrado” e saber sua letra e como se portar durante sua execução era uma obrigação patriótica.

No mundo inteiro, os hinos junto com as respectivas bandeiras têm sido os principais símbolos de uma nação. Isso acontece desde o surgimento dos estados nacionais, entre os séculos 18 e 20, para expressar o patriotismo, a união e o orgulho de um povo. O teor das letras e o tom das músicas têm variado desde um espírito mais guerreiro, como a Marselhesa, o hino nacional francês, até uma elegia ecologicamente correta das riquezas naturais, como no caso do hino brasileiro. Os mais antigos hinos nacionais do mundo são o japonês e o holandês. O primeiro teve sua letra escrita no século 9, mas só foi musicado em 1860, e o segundo foi composto na segunda metade do século 16 [fonte: National Anthems of the World Organisation].

Mas o caso de respeito ao hino no Brasil parece ser atípico. Se tomarmos as mais populares competições esportivas como exemplo, podemos observar que, salvo raras exceções, o descaso com este símbolo nacional parece ser mais frequente nas terras tupiniquins. E aparentemente há algumas razões históricas e sociais para isso. Uma delas é a associação do hino ao ufanismo cívico imposto pelos regimes totalitários no país, principalmente no período ditatorial de Getúlio Vargas e no regime militar pós-1964. Outra razão é como o brasileiro tem lidado com sua cidadania, que por deficiências educacionais e culturais anda bastante combalida.

No caso brasileiro, há também questões práticas como a quantidade de versos e a dificuldade de se pronunciar e compreender atualmente alguns dos vocábulos utilizados. Para se ter uma idéia, um dos mais famosos hinos do mundo, o “God Save the Queen” ou “God Save the King”, entoado nos países do Reino Unido, é composto por 21 versos, enquanto o hino brasileiro apresenta 50. Além disso, várias palavras não fazem mais parte do repertório médio da população, o que dificulta sua compreensão e memorização.

Na próxima página, descubra mais sobre a história do hino nacional brasileiro e sobre o que canta sua letra.

O hino nacional brasileiro

A atual música do hino nacional é a mesma que foi composta por Francisco Manuel da Silva, entre 1822 e 1823, para celebrar a Independência do país. No período do Império, ela recebeu duas letras diferentes. Após a proclamação da República, em 1889, com a intenção de apagar os principais símbolos do período monárquico, foi feito um concurso para a criação de um novo hino. Mas, a reação contra essa idéia foi tal que o novo governo republicano voltou atrás e manteve a música composta por Francisco Manuel da Silva como a oficial. Um novo concurso foi feito então apenas para alterar a letra. Em 1909, os versos compostos por Joaquim Osório Duque-Estrada foram os escolhidos. A letra foi oficializada em 1922, por ocasião das comemorações do centenário da Independência.
Quem foram os autores

O compositor Francisco Manuel da Silva (1795-1865) estudou música desde criança com o padre José Maurício Nunes Garcia. Ele teria composto o hino sob o nome de “Marcha Triunfal”, em celebração à Independência entre 1822 e 1823, mas o teria executado pela primeira vez somente em 1831, por ocasião da abdicação de D. Pedro 1.º. Além de outros hinos, compôs música instrumental e um extenso repertório de música sacra. Mestre Compositor da Capela Imperial, foi também diretor de vários teatros e companhias líricas.

Joaquim Osório Duque-Estrada (1870-1927) escreveu poesias, dramaturgias, livros didáticos e traduções, além de colaborar para jornais do Rio de Janeiro. Abolicionista e republicano atuou ao lado de importantes nomes desses movimentos como José do Patrocínio e Silva Jardim. Em outubro de 1909, elaborou o seu “Projeto de Letra para o Hino Nacional Brasileiro”, cujos versos deveriam se adaptar à música composta por Francisco Manuel da Silva. Em 1915, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras.

Se comparado aos hinos inspirados em cantos de guerra, que geralmente trazem letras curtas, práticas e simples, os cinquenta versos composto por Duque-Estrada formam um poema complexo. Além do problema da sua extensão, há ainda uma série de palavras que caíram em desuso e não fazem parte do vocabulário da população. Termos como “plácidas”, “fúlgidos”, “florão” e “lábaro”, entre outros, dificultam a compreensão do sentido dos versos e consequentemente a memorização e a pronúncia.

Pode bater palma

Quando o hino nacional brasileiro é executado devem ser obedecidos alguns procedimentos protocolares estabelecidos pela legislação. A Lei n.º 5.700, de 1971, definiu que durante a sua execução “todos devem tomar atitude de respeito, de pé e em silêncio, o civis do sexo masculino com a cabeça descoberta e os militares em continência, segundo os regulamentos das respectivas corporações”. A Lei ainda diz que é vedada qualquer outra forma de saudação durante a execução, assim como apresentar quaisquer arranjos vocais ou instrumentais que não sejam os oficiais, sem prévia autorização do presidente da República. A legislação não faz nenhuma menção a como se comportar após a finalização do hino. Assim, se você quiser bater palmas, pode bater.

A letra do hino brasileiro faz principalmente uma ode às belezas e riquezas naturais do país. Fatos históricos como a declaração da Independência, mencionada na primeira estrofe, e a coragem patriótica do povo são emolduradas por uma natureza encantadora. Esse teor da letra e o tom da música compõem uma obra animada, fazendo dele um dos mais alegres hinos nacionais do mundo, segundo o jornal britânico “The Guardian”. Apesar do elogio dos ingleses, o descaso com o hino nacional brasileiro parece aumentar na terra adorada. Não bastassem as dificuldades que oferece para ser memorizado, ele ainda enfrenta o preconceito de ser um dos símbolos usados pelas ditaduras no país, o que gerou um certo grau de aversão a ele, além de um desinteresse das novas gerações com os instrumentos tradicionais do nacionalismo em um mundo em que há uma crescente internacionalização e interação das culturas.
Decifrando o hino nacional

Confira a letra completa do hino e um breve glossário que revela o significado das palavras menos comuns encontradas nos versos:

Parte 1

Ouviram do Ipiranga as margens plácidas
De um povo heróico o brado retumbante,
E o sol da liberdade, em raios fúlgidos,
Brilhou no céu da pátria nesse instante.

Se o penhor dessa igualdade
Conseguimos conquistar com braço forte,
Em teu seio, ó liberdade,
Desafia o nosso peito a própria morte!

Ó Pátria amada,
Idolatrada,
Salve! Salve!

Brasil, um sonho intenso, um raio vívido
De amor e de esperança à terra desce,
Se em teu formoso céu, risonho e límpido,
A imagem do Cruzeiro resplandece.

Gigante pela própria natureza,
És belo, és forte, impávido colosso,
E o teu futuro espelha essa grandeza.

Terra adorada,
Entre outras mil,
És tu, Brasil,
Ó Pátria amada!
Dos filhos deste solo és mãe gentil,
Pátria amada,
Brasil!

Parte 2

Deitado eternamente em berço esplêndido,
Ao som do mar e à luz do céu profundo,
Fulguras, ó Brasil, florão da América,
Iluminado ao sol do Novo Mundo!

Do que a terra, mais garrida,
Teus risonhos, lindos campos têm mais flores;
"Nossos bosques têm mais vida",
"Nossa vida" no teu seio "mais amores."

Ó Pátria amada,
Idolatrada,
Salve! Salve!

Brasil, de amor eterno seja símbolo
O lábaro que ostentas estrelado,
E diga o verde-louro dessa flâmula
- "Paz no futuro e glória no passado."

Mas, se ergues da justiça a clava forte,
Verás que um filho teu não foge à luta,
Nem teme, quem te adora, a própria morte.

Terra adorada,
Entre outras mil,
És tu, Brasil,
Ó Pátria amada!
Dos filhos deste solo és mãe gentil,
Pátria amada,
Brasil!


Glossário

Plácidas: serenas, tranquilas, pacíficas, brandas, sossegadas
Brado: clamor, grito
Retumbante: refletir o som com estrondo, ecoar, ressoar
Fúlgidos: cintilantes, brilhantes
Penhor: garantia, segurança, prova
Vívido: luminoso, brilhante
Límpido: claro
Resplandece: brilha
Impávido: intrépido, destemido
Colosso: objeto de enormes dimensões, descomunal
Fulguras: resplandece, brilha
Florão: peça de ouro ou pedras preciosas, à feição de flor, no centro de uma coroa
Garrida: alegre, brilhante, viva
Lábaro: estandarte dos exércitos romanos
Ostentas: mostrar ou exibir com orgulho
Flâmula: bandeira
Clava: pau pesado usado como arma

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fonte: http://pessoas.hsw.uol.com.br/hino-nacional.htm

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